Nada acontece ao homem que não é próprio do homem
Marco Aurélio, imperador romano.
Conta a professora e filósofa Lucia Helena Galvão esta estória, de um príncipe cujo pai, o rei, tinha um conselheiro, um sábio ancião que, de forma serena, sempre repetia a máxima de vida segundo a qual “tudo acontece para o melhor, nada acontece por acaso”.
O príncipe cresceu ouvindo o jargão do ancião. Jovem e imediatista, achava que o sábio não tinha razão e que as coisas eram absolutamente casuais. Portanto, aquele conselheiro não tinha sabedoria alguma.
Certo dia, seu pai falece e ele assume o poder. Logo pensa em dispensar o conselheiro derrotista e conformista que só sabia repetir sua velha máxima.
Em uma bela ocasião, o novo rei resolve ir caçar com seus homens e, junto com eles, o sábio. O novo rei pretendia, na primeira oportunidade em que o ancião repetisse o jargão, se livrar dele.
Quando chegaram ao meio da floresta, o tempo sofre uma reviravolta, e uma ventania violenta toma conta e derruba um galho, que bate contra a testa do novo monarca, derrubando-o do elefante e resultando em um corte profundo na testa.
Caído no chão, meio atordoado, e com todos em volta para acudi-lo, o rei se levanta e reclama: “Que absurdo, como pôde acontecer uma coisa dessas comigo? Me machuquei inutilmente”.
Logo, o sábio conselheiro chega perto dele e fala: “Não se preocupe. Tudo acontece para o melhor, nada é por acaso”.
Indignado com o sábio, o rei ordenou a seus homens que cavassem um buraco, amarrassem o ancião e o deixassem para os chacais comerem. “Agora quero ver se ele vai achar que é para o melhor”, disse o monarca.
Ao ir embora, o rei se perde de sua comitiva pela floresta e escuta de longe um barulho. Pensando serem seus homens, ele vai até os comandados e encontra um grupo de bandidos, que o aprisionam. Os ladrões estavam fazendo um culto a uma divindade e teriam que entregar um ser humano em sacrifício.
Os bandidos levam o novo rei para o altar e, no momento de sacrificá-lo, percebem na testa dele um corte. Reclamam que, para servir de sacrifício à divindade, o ser humano deve estar íntegro fisicamente. Então o mandam embora, pois aquele homem não mais servia.
No mesmo momento, o novo rei lembra-se da sabedoria do velho sábio e admite que o conselheiro tinha razão.
Mais tarde, ao reencontrar seus homens, ele vai em busca do conselheiro, afirmando que cometera uma injustiça. Ao chegar no poço, retira o sábio de lá e lhe pede desculpas, dizendo que a ferida o salvou.
O velho disse: “É, aqueles bandidos que tentaram te matar passaram por aqui também. Só não conseguiram me achar pois eu estava dentro do buraco. Tudo acontece para o melhor, nada é por acaso”.
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